Importa agora recuperar a unidade dos professores e
perspectivar o futuro da luta.
O Cordão Humano que paralisou a cidade de Lisboa foi crucial
para restabelecer a confiança.
Texto de Manuel Grilo, publicado no
jornal Esquerda nº
34
A luta dos professores está numa fase decisiva. Depois de
gigantescas manifestações e greves de adesão sem par na história do movimento
sindical docente pediu-se aos professores a resistência escola a escola. O que
é pedido a cada professor e educador é que persista na desobediência "cívica",
na recusa de entrega de "objectivos individuais" para a avaliação de
desempenho.
Depois dos grandes momentos colectivos passou-se para o interior
das escolas e para uma luta em que a determinação e a coragem individuais e
colectivas eram (são) determinantes. Terá sido excessivo? Os últimos dados
referem que, apesar de poderosíssimas chantagens e ameaças algumas dezenas de milhar
de docentes persistem nesta forma de luta o que, na prática, transforma a
avaliação de desempenho dos professores numa fantochada.
Importa agora compreender esta luta e enquadrá-la
politicamente para que não se esvaia em reivindicações corporativas, na fé em
miraculosas soluções jurídicas ou, pior ainda, num beco sem saída que uma derrota
sempre comportaria.
Os ataques aos professores começaram por uma verdadeira campanha
negra que, logo em início de mandato, Maria de Lurdes Rodrigues e seus ajudantes
levaram a cabo de forma metódica, colocando na opinião pública a ideia de que
os professores trabalhavam pouco, ganhavam muito e faltavam imenso. Era, pois,
necessário "metê-los na ordem". Com um estatuto profissional que dividisse e
criasse uma categoria de professores com típicas tarefas de enquadramento
(avaliação, cargos de coordenação) e um gestor que mandasse nas escolas, isto
é, que se constituísse como o braço do Governo em cada escola, os professores entrariam
"na ordem". A ajudar a compor o filme a avaliação de desempenho domesticaria os
mais recalcitrantes e constituir-se-ia como um importante instrumento de
repressão e normalização de comportamentos.
Se no início muitos viram para onde apontava este processo é
legítimo dizer agora que só quando a avaliação de desempenho se iniciou a maioria
compreendeu a verdadeira camisa de varas que lhe queriam enfiar à força e se
mobilizou para a luta. E fê-lo da forma poderosa que todos os portugueses
viram, na Manifestação da Indignação de 8 de Março de 2008, com 100.000 na rua
e oito meses depois, a 8 de Novembro, com 120.000 (o conjunto dos professores
portugueses ronda os 140.000).
Os sindicatos dos professores são dos mais poderosos do país
e estiveram até agora unidos na Plataforma Sindical dos Professores.
Esta afirmação é essencial para compreender a persistência da
luta dos professores e a impressionante série de acções de luta (manifestações,
vigílias, greves) que nos últimos três anos os professores realizaram. Não por
acaso, o Governo erigiu como seu objectivo destruir a força destes sindicatos.
De tudo deitou mão, desde a intimidação à manipulação da opinião
pública, da tentativa de impedimento de reuniões sindicais à recente aprovação da
lei sindical para a administração pública que restringe os direitos sindicais e
sangra os sindicatos dos seus recursos.
O Governo sabe o que faz - sem sindicatos fortes e
enraizados a luta dos professores, como de resto de todos os trabalhadores,
rapidamente soçobraria. Dito isto, que creio ser inquestionável, importa conhecer
uma nova realidade que surgiu neste processo - os Movimentos autónomos de professores
que se afirmaram desde o início como importantes factores de mobilização e de
radicalização da luta.
A importância destes movimentos, desigual afirme-se desde
já, porque muito contraditórios entre si, adveio da percepção que muitos
professores tinham e ainda têm de que os principais sindicatos de professores,
os da FENPROF, estão excessivamente dependentes da orientação do PCP. Percepção
justa nuns casos, nem tanto noutros como conviria destrinçar. A aparente
"independência" dos movimentos face aos partidos políticos funcionou como
factor de credibilização do discurso sindical e potenciou a sua capacidade de mobilização.
Quando se desenhou um divórcio entre estes movimentos e os sindicatos, que
colocaria em risco a luta, vale a pena afirmar a importância dos que tiveram a
lucidez de provocar pontes e construir caminhos de unidade, em particular do
Movimento Escola Pública.
A luta dos professores está, agora, num momento de viragem. Se
algumas dezenas de milhar de professores e educadores continuam a resistir e, com
essa resistência, impedem a vitória do Governo nesta batalha, não é menos
verdade que muitos cederam e o ambiente nas salas de professores se degradou de
forma muito acentuada. Importa agora recuperar a unidade dos professores e
perspectivar o futuro da luta.
Para reconstruir a unidade dos professores torna-se
necessário mobilizar, com base num conjunto de propostas claras e credíveis, o
conjunto dos professores, lançando pontes entre todos, dando ânimo lá onde domina
hoje o desânimo e afirmando a possibilidade concreta de vencer esta luta.
O Cordão Humano que paralisou a cidade de Lisboa, unindo a 5
de Outubro à Assembleia da República e à residência oficial do primeiro-ministro
no passado dia 7 de Março foi crucial para restabelecer a confiança. Tão
importante será também a semana de auscultação dos professores que acontecerá
na segunda semana de Abril e que desenhará os caminhos da luta para o 3º período
escolar. Que passará certamente por novos momentos fortes que confrontem este Governo
e possibilitem reafirmar a profissão docente no quadro de uma escola pública para
todos que vamos preservar e ajudar a desenvolver.
Manuel Grilo Dirigente do Sindicato dos
Professores da Grande Lisboa
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