Em entrevista ao esquerda.net, João
Semedo alerta que "quando começar a faltar o dinheiro vão haver
doentes que vão ficar sem tratamento" e fala também dos tempos
máximos de espera no SNS.
O deputado bloquista salienta que com o
OE 2010 vai continuar a "precarização e instabilidade dos
profissionais" de saúde, manifesta o apoio à luta dos enfermeiros
e denuncia o recurso ao trabalho "vendido por elevado custo pelos
serviços privados".
João Semedo chama também a atenção
para o facto da carta de direitos de acesso aos utentes do SNS,
proposta pelo Bloco de Esquerda e aprovada pelo parlamento, continuar
a não ser aplicada. Pela carta, cada serviço de saúde deve definir
tempos máximos de resposta garantida, mas a "esmagadora maioria"
dos hospitais e centros de saúde continua a não cumprir essa carta
de direitos. O deputado bloquista anuncia que o Bloco vai empenhar-se
numa campanha nacional "junto das instituições de saúde", para
que a carta seja aplicada.
Texto integral da entrevista:
No sector da saúde, o que podemos
esperar deste Orçamento de Estado?
João Semedo: O Orçamento para
a saúde vai diminuir em 2010. Os hospitais vão ter menos dinheiro
para mais serviço. Isso vai significar a ruína dos hospitais. Os
hospitais hoje estão descapitalizados, estão carregados de dívidas
como nunca estiveram, isso significa que quando começar a faltar o
dinheiro vão haver doentes que vão ficar sem tratamento, isso é
gravíssimo e é um aspecto muito importante deste orçamento de
Estado. Por outro lado, vai continuar a precarização e
instabilidade dos profissionais, vai continuar o recurso ao trabalho
vendido por elevado custo pelos serviços privados e por vários
estabelecimentos privados. Isso acontece já hoje, vai continuar a
acontecer e os privados mais uma vez vão ganhar dinheiro à custa do
Serviço Nacional de Saúde (SNS). Isso verifica-se em muitos sítios.
Ainda recentemente o Bloco de Esquerda teve oportunidade de denunciar
contratações desnecessárias e que não cumprem as regras de
transparência da administração pública, que se verificam, por
exemplo, no INEM. Como também tivemos oportunidade de apoiar a luta
dos enfermeiros, porque ela é inteiramente justa. Os enfermeiros
devem ser pagos como todos os outros licenciados e não há nenhuma
razão para que eles constituam uma excepção. Hoje, reina a
precariedade, reina a instabilidade, reina o desprezo pelas carreiras
profissionais, o desprezo pela diferenciação profissional. Isso
verifica-se não apenas nos enfermeiros verifica-se também com
outros corpos profissionais e significa também a existência no SNS
de um conjunto de contratados a empresas privadas, que têm
remunerações superiores à dos profissionais do próprio SNS,
criando uma grande diferenciação de salários, grande diferenciação
de condições de trabalho e prejudicando a coesão e o trabalho em
equipa, que é essencial para a qualidade dos cuidados de saúde.
O tempo de espera para os cuidados
hospitalares continua a ser maior do que a lei prevê. Que
iniciativas terá o Bloco para este assunto?
João Semedo: O parlamento
aprovou por proposta do Bloco de Esquerda uma carta de direitos de
acesso dos utentes do SNS. Essa carta diz fundamentalmente que os
hospitais e os centros de saúde têm de definir tempos máximos de
resposta garantida, para evitar que os utentes estejam eternamente à
espera de uma consulta, de um exame, de um internamento ou de uma
cirurgia. A esmagadora maioria dos hospitais, a esmagadora maioria
dos centros de saúde não cumpre essa carta de direitos. O governo
aprovou esses tempos de espera, mas nada fez para que eles se
tornassem realidade. E, portanto, é necessário que a opinião
pública, que os utentes do SNS, que os cidadãos procurem junto dos
seus hospitais e dos seus centros de saúde quais as razões porque
eles não estão a cumprir, nem definiram, nem divulgaram, nem
cumprem esses tempos de espera. Este era um instrumento muito
importante para melhorar a qualidade e a prontidão do acesso e está
a acontecer exactamente o contrário. Hoje continua a esperar-se
muito tempo por uma consulta, por um internamento ou por um exame, um
simples exame, isso não é aceitável, porque as pessoas precisam de
ter serviços no momento em que deles precisam e não no momento em
que os serviços, por esta ou aquela razão, lhe podem facilitar e
facultar esse atendimento. E, portanto, o Bloco de Esquerda vai
empenhar-se numa campanha nacional junto das instituições de saúde,
hospitais e centros de saúde, procurando que o movimento social e os
cidadãos se interessem e se movimentem para que os hospitais e os
centros de saúde definam esses tempos de espera e os cumpram a bem
de consultas e de atendimentos de serviços de saúde a tempo e
horas, que é isso que é necessário para a saúde dos portugueses.